
Imagine-se de volta a Random, um reino pintado em tons góticos, onde cada respiração carrega o sussurro de folhas de outono e o tilintar de dados mágicos. Em Lost in Random: The Eternal Die, esse sentimento se intensifica!
Após o sucesso poético do original (2021), agora somos convidados a revisitar o destino capturado dentro de um dado e, dessa vez, a protagonista é a própria Rainha Aleksandra.
Esse “expansão” traz à tona um universo ainda mais denso, onde combatemos não só com espadas e cartas, mas também com a força do acaso e o peso de nossas decisões. Cada passo parece narrado por um autor invisível, enquanto os cenários desabrocham como páginas de um conto sombrio, vivo e imprevisível.
Ao fim dessa primeira travessia pela atmosfera de Random, um novo vislumbre se apresenta como um fragmento que não se apresenta, mas provoca a nossa imaginação criativa.
Um Conto que Nunca Para de Girar
Em The Eternal Die, a história não apenas continua como também se transforma em um novo caminho narrativo.
Saímos do ponto de vista de Even, protagonista do jogo original, para explorar as sombras e memórias de Aleksandra, a enigmática rainha de Random. Pela primeira vez, o jogo não nos oferece um herói em busca de libertação, mas sim uma personagem que já detém o poder e, ao mesmo tempo, é prisioneira dele.
A narrativa se desenrola como um conto oral de um mundo quebrado, onde os fragmentos do passado colidem com as decisões do presente. As cidades continuam organizadas segundo o número que cada uma representa, mas agora há um sentimento de ciclo e de repetição inevitável, como se estivéssemos dentro de um loop narrativo onde as peças querem escapar, mas o tabuleiro insiste em mantê-las no jogo.
A ambientação é profundamente inspirada pelo surrealismo gótico. Random continua a parecer uma mistura de fábula sombria e teatro de bonecos, onde cada canto esconde metáforas sobre controle, sorte e identidade.
Mas, diferente do primeiro jogo, The Eternal Die adiciona camadas de melancolia e autocrítica à sua própria mitologia, é como se o próprio mundo começasse a duvidar de suas regras.
Personagens secundários ganham nova relevância com figuras que resistem ao sistema, outras que se agarram à aleatoriedade como uma religião, e ainda aquelas que apenas sobrevivem, resignadas ao dado que caiu.
O jogo acerta ao não querer entregar respostas logo de cara, e transforma o “azar” em um elemento filosófico, considerando que o verdadeiro vilão pode ser o sistema de Random, não os inimigos que enfrentamos.
Essa “expansão” não é sobre salvar o mundo, é sobre entender por que o mundo precisa ser salvo, e se vale a pena tentar.
Estratégia nas Entrelinhas
Lost in Random: The Eternal Die não apenas joga dados, ele os transforma em instrumentos de decisão, criando um sistema onde sorte e tática se entrelaçam como marionetes no mesmo fio. O novo Título leva essa fórmula um passo além, ajustando seu ritmo e ampliando as possibilidades estratégicas sem trair sua essência.
O destaque do combate ainda permanece focado entre “turnos invisíveis”, onde ataques em tempo real são intercalados com momentos em que o mundo congela e o dado é lançado, revelando cartas que moldam seu arsenal, defesa, armadilhas e buffs.
A grande novidade aqui é a introdução de cartas de modificação temporal e manipulação de sorte, que permitem ao jogador influenciar o “clima” do campo de batalha, uma sacada inteligente que insere o conceito de “caos controlado” como parte ativa da estratégia.
The Eternal Die também refina o ritmo das batalhas, onde antes alguns confrontos pareciam estender-se sem motivo, agora eles têm objetivos mais claros, arenas mais criativas e inimigos que desafiam a improvisação. Não basta atacar com força, é preciso interpretar a situação, escolher as cartas certas e usar o tempo como recurso.
Outro ponto forte está nas missões paralelas e interações ambientais que, mesmo simples, se encaixam organicamente no mundo e recompensam a atenção do jogador com mais do que itens — entregando contexto, histórias curtas e mini-puzzles que reforçam a imersão narrativa.
Porém, a curva de aprendizado pode ainda ser um obstáculo para quem chega agora. O jogo assume que o jogador entende suas dinâmicas base, o que pode tornar os primeiros minutos de The Eternal Die menos convidativos para iniciantes.
Ainda assim, para quem já dominava o sistema, The Eternal Die oferece uma experiência mais refinada, onde cada jogada parece escrita à mão, mas com tinta invisível.
É como se o jogo dissesse que o acaso existe, mas quem dá sentido a ele . . . é você.
Beleza Caótica
O mundo de The Eternal Die não é apenas construído, ele é esculpido com intenções claras, ou devemos dizer . . . obscuras?
Cada esquina de Random parece ter sido entalhada à mão, com linhas tortas e sombreadas que lembram livros ilustrados antigos e animações em stop-motion. Aqui, tudo é estranho, mas nunca desconexo — o grotesco é bonito, o feio, encantador e o imprevisível . . . inevitável.
Visualmente, o jogo mantém a assinatura estética que consagrou o título anterior com um misto de gótico, expressionismo e fábula escurecida. Mas, The Eternal Die vai além na ousadia, apresentando novos distritos e cenários com paletas de cor ainda mais contrastantes, que refletem estados emocionais dos personagens e a instabilidade do mundo ao redor.
É como se o próprio cenário estivesse contaminado pela incerteza.
Os personagens — todos com formas alongadas, olhos inquietos e sorrisos duvidosos — lembram marionetes quebradas que nunca param de atuar. Mas, é justamente essa estranheza que torna Random tão viva que, ela não precisa tentar agradar, pois sempre chama nossa atenção aos seus detalhes criativos.
A trilha sonora, composta mais uma vez por Theodore Shapiro (ou seu sucessor espiritual), cria camadas sonoras que alternam entre o lirismo infantil e o suspense de um pesadelo. Os momentos de silêncio, por sua vez, são tão expressivos quanto os musicais, criando tensão onde palavras não chegam.
Destaque também para os efeitos sonoros e vozes, em particular, a dublagem (em inglês) está afinada com o tom teatral do universo, onde há exageros, pausas dramáticas, sussurros e declarações quase poéticas. Tudo ajuda a construir uma atmosfera em que o mundo parece contar histórias mesmo quando ninguém está falando.
É a beleza do caos transformada em linguagem visual e sonora.
A Roleta do Desempenho
Por mais fantástico que seja o mundo de The Eternal Die, a sua magia precisa de uma base sólida para funcionar e, é aqui que o jogo caminha entre a sorte e a cautela.
De acordo com colegas da Mídia, nos testes realizados em diferentes plataformas, o desempenho mostrou-se estável na maior parte do tempo, com boas otimizações no PlayStation 5 e Xbox Series X/S, incluindo tempos de carregamento rápidos, fluidez constante e fidelidade visual respeitável. No PC, plataforma da nossa análise, o jogo se comporta bem mesmo em configurações medianas, mas ainda requer ajustes finos em alguns cenários mais complexos, principalmente em máquinas com GPUs da série GTX anteriores à linha RTX.
O jogo roda a 60fps com resolução dinâmica na maior parte das situações, mas há quedas ocasionais durante transições rápidas de ambiente e combates mais intensos, nada que comprometa a jogabilidade, mas perceptível para os mais atentos. Felizmente, não houve ocorrências relevantes de bugs críticos, e o sistema de checkpoints está mais confiável do que no título anterior, prevenindo frustrações em combates prolongados.
A interface é intuitiva e bem posicionada, mas poderia oferecer mais opções de acessibilidade, pois tamanhos de fonte, filtros de contraste e leitura automática ainda são limitados. Para uma obra que aposta tanto na narrativa e imersão visual, isso pode ser uma barreira para parte do público.
Destaque positivo para a tradução em português, que mantém o tom poético e lúdico da obra original, com adaptações bem localizadas que respeitam o estilo do universo de Random. Algumas expressões se perdem, é verdade, mas a alma do texto permanece intacta.
No fim, The Eternal Die gira bem em seu tabuleiro técnico, mesmo que uma ou outra peça ainda pareça fora de lugar. Como o próprio universo do jogo, é um sistema que funciona mesmo que, às vezes, desafie as probabilidades.
Um RPG de Aventura ou um Teatro Interativo?
The Eternal Die é um daqueles jogos difíceis de encaixar em uma caixinha e talvez esse seja justamente seu maior trunfo. Ele se apresenta como uma aventura com elementos de RPG tático, mas o que realmente o move é a narrativa performática, com foco nas escolhas, no improviso e na metáfora.
O combate baseado em cartas e dados pode lembrar títulos como Slay the Spire ou Dicey Dungeons, mas o ritmo é outro, indo para uma linha contemplativa, quase que teatral. As batalhas não servem só como obstáculos, mas como extensões dramáticas da história.
Lutar em The Eternal Die é como interpretar uma cena, onde cada carta jogada, representa uma fala e cada movimento, uma escolha de direção.
Narrativamente, ele caminha próximo de títulos como Alice: Madness Returns ou Little Misfortune, mas sem se perder no surrealismo gratuito. Mesmo com toda sua estranheza, o jogo tem uma lógica própria.
O mundo de Random pode parecer caótico à primeira vista, mas cada elemento, por mais excêntrico que seja, tem um propósito dentro da história. E isso o distancia de muitos jogos que tentam ser “diferentões” apenas por estética.
Por outro lado, sua estrutura não é voltada para progressão tradicional de RPGs, ou seja, não há árvores complexas de habilidades, nem sistemas de loot ou evolução numérica profunda. A construção de personagem é simbólica e narrativa, se concentrando nas escolhas, nos diálogos e nos caminhos tomados (ou evitados).
Para jogadores que buscam um RPG de ação puro, isso pode soar limitado. Mas, para quem valoriza imersão, atmosfera e intenção narrativa, The Eternal Die oferece uma experiência com identidade autoral, que respeita o tempo do jogador e propõe um universo coerente com suas próprias regras.
No fim, ele não quer ser só jogado, ele quer ser assistido, sentido e interpretado. E nesse palco entre gêneros, o jogo encontra o seu melhor papel, dando vida a um teatro interativo, onde o acaso dita a cena, mas a emoção dá o tom.
Onde o Dado Cai Dessa Vez?
The Eternal Die não tenta ser grandioso e, na real, nem precisa para ser notado. Em vez disso, caminha pelas sombras do seu próprio universo, ampliando a mitologia de Random com delicadeza, ousadia e um estranho senso de familiaridade.
Ele não segue a lógica tradicional dos jogos de ação ou RPG — ele constrói a sua própria, onde o acaso é mecânica, metáfora e mensagem.
Ao invés de mirar em quem busca sistemas complexos ou progresso numérico, o jogo se conecta com quem procura experiências narrativas com personalidade e alma. Cada cidade, cada personagem, cada reviravolta carrega uma pergunta não respondida, fazendo com que essa incerteza de brilho ao seu mundo.
Não é um jogo para ser “rushado”, é para ser absorvido com calma e contemplação. Caminhe devagar, lançe o dado, ouça o que o silêncio diz e entenda que, às vezes, as escolhas que fazemos dentro de um jogo dizem muito sobre quem somos fora dele.
No fim das contas, Lost in Random: The Eternal Die não nos oferece controle total, e essa é justamente sua maior liberdade. Porque quando o acaso dita a cena, o que realmente importa é como você escolhe interpretá-la.
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- Games
- 10 de junho de 2025
- 8.5Total Score
Lost in Random: The Eternal Die é um mergulho em um universo encantadoramente quebrado, onde cada jogada conta mais como expressão do que como cálculo. Sua direção de arte é hipnotizante, o sistema de combate é criativo, e a ambientação é repleta de alma.
Falta-lhe apenas mais acessibilidade e refinamento técnico para atingir um novo patamar, mas o que entrega, entrega com identidade. Um teatro de sombras e escolhas, que fala com quem escuta com o coração.