The Alters – Na Fronteira Entre o Controle e o Caos Interior

Quando Jan Dolski acorda em uma base circular, isolado em um planeta hostil, sua única companhia são vozes que compartilham seu rosto, mas não suas escolhas. Em The Alters, sobrevivência e identidade colidem em uma narrativa onde o maior perigo não vem apenas de fora, mas de dentro também.

A 11 Bit Studios apresenta uma experiência onde cada decisão se transforma em espelho, divergindo o protagonista em múltiplas versões possíveis de si mesmo. É um sci-fi psicológico, mas também uma história profundamente humana sobre remorso, alternativas e o que somos capazes de fazer, ou de deixar para trás, e seguir em frente.

A Premissa e o Peso da Existência

Jan Dolski acorda sozinho em um planeta hostil, cercado por um ambiente radiotivo e por uma ameaça que se move como um relógio de areia prestes a esvaziar. E não há heróis ao seu lado, apenas versões alternativas de si mesmo, os chamados Alters.

Cada um desses alter egos carrega não só uma habilidade diferente, mas também o peso de escolhas que Jan nunca fez, e que agora se materializam como companheiros (ou espelhos desconfortáveis).

A proposta da 11 bit studios é tão ousada quanto íntima, ao oferecer uma experiência de sobrevivência em que você precisa criar diferentes versões de si mesmo para tentar permanecer vivo. Mas, essas versões não são apenas ferramentas, são fragmentos de quem você poderia ter sido, cada uma com memórias próprias, traumas específicos e uma relação única com a sua versão “original”.

O jogo mergulha de cabeça na ideia de identidade, propondo que dê vida a todas as suas escolhas não feitas para trabalhar coletivamente com você.

Neste cenário, o sci-fi de The Alters deixa de ser apenas um plano de fundo para se transformar em um “espelho” de si mesmo. Não se trata apenas de sobreviver em um planeta inóspito, mas de enfrentar, negociar e aprender com aquilo que você suprimiria em si mesmo, seja por orgulho, medo ou arrependimento.

O resultado é uma narrativa que transforma cada passo em uma reflexão, obrigando você a escolher quem deseja ser, quando todas as outras versões si não forem mais necessárias.

Sobreviver é um Processo Solitário

Ao contrário do que a premissa pode sugerir, The Alters não é um jogo sobre múltiplas personalidades, é um jogo sobre responsabilidade, rotina e, acima de tudo, escolhas.

Jan está preso em um planeta hostil, cuja rotação anômala cria janelas muito curtas de tempo antes que a radiação mortal do sol incinere tudo à superfície. Cada ciclo de 24 minutos (tempo real) representa uma corrida contra o tempo, nos permitindo sair para buscar recursos, retornar à base e planejar o próximo movimento antes que o ciclo se reinicie.

A construção da base é mais do que uma questão de estética ou expansão, ela é a espinha dorsal da sobrevivência. Cada módulo construído oferece funcionalidades críticas como geradores, refinarias, centros de fabricação, dormitórios, zonas de comunicação, e especialmente, as câmaras de clonagem onde surgem os Alters.

Mas, operar essa estrutura colossal sozinho seria impossível e, é aí que a jogabilidade se expande.

O gerenciamento da base e dos Alters funciona como um mecanismo gigantesco que precisa estar em constante funcionamento. Cada Alter pode ser designado para tarefas específicas, como fabricar ferramentas, operar máquinas, fazer manutenção, refinar materiais ou pesquisar melhorias.

O ritmo é cadenciado, porém tem que ser preciso ao planejar, executar e ajustar. Um erro ou atraso custa caro, pois o tempo é o recurso mais precioso do jogo, e não há como recuperá-lo.

A exploração externa, por sua vez, é arriscada, limitada e angustiante.

Jan precisa administrar sua bateria, temperatura corporal e oxigênio, enquanto escaneia o ambiente em busca de recursos ou segredos enterrados. Não há inimigos tradicionais, o próprio planeta age como um predador natural e um passo em falso pode condenar toda a operação.

A experiência de sobrevivência em The Alters é solitária, mas carregada de tensão e urgência. A cada novo ciclo, sentimos o peso de estar improvisando contra o tempo, contra a lógica e, em certos momentos, contra si mesmo.

E é justamente quando começamos a delegar tarefas aos Alters que o caos controlado se instala, e a verdadeira natureza do jogo se revela.

Ferramentas, Recursos e o Ritmo da Sobrevivência

Além dos dilemas humanos, The Alters constrói sua tensão no gerenciamento de recursos, tempo e infraestrutura, exigindo decisões práticas em meio ao caos emocional.

A base do jogador é móvel, e cada compartimento — cozinha, oficina, enfermaria, salas de comando — precisa ser planejado, construído e melhorado com materiais coletados em incursões externas. Esses recursos são limitados e muitas vezes escassos, o que transforma cada pequena expedição num risco calculado.

As ferramentas adquiridas ou criadas ajudam a desbloquear novas áreas, melhorar a eficiência dos Alters ou automatizar tarefas, algo fundamental, já que o tempo é implacável e Jan se vê constantemente pressionado por prazos, necessidades e conflitos internos.

O crafting não é apenas um sistema de progressão, mas uma engrenagem vital da sobrevivência, alimentando tanto as funções básicas da base quanto o preparo para eventos climáticos extremos ou falhas estruturais.

É nesse ponto que o ritmo do jogo se define, desmonstrando que não é um city builder, nem um simulador de vida, mas um organismo em constante mutação, onde cada decisão impacta o funcionamento da base, o bem-estar dos Alters e a própria sanidade do protagonista.

Aqui, começamos a perceber que sobreviver em The Alters não é sobre dominar o ambiente, mas sobre aprender a coexistir com seus próprios limites.

A Rotina de um Homem Só

Na superfície deste planeta hostil, o tempo corre em ciclos e cada minuto importa. A rotina do protagonista, Jan, gira em torno de sobreviver ao próximo nascer do sol, ou melhor, evitar que ele o destrua.

O mundo de The Alters é banhado por um sol letal, que obriga o jogador a pensar em cada ação com precisão cirúrgica: minerar, construir, reparar, comer e dormir . . . tudo deve ser calculado para não ser consumido pela radiação.

É nesse compasso que o jogo introduz seu ritmo, nos desafiando em uma espécie de “corrida controlada” contra o tempo e contra versões de nós mesmos.

Cada estrutura construída na base, cada peça de maquinário e cada novo Alter criado depende de recursos que precisam ser extraídos em tempo hábil. Essa mecânica de escassez reforça o peso de cada escolha, tornando até as ações mais simples em decisões estratégicas com impacto direto na sobrevivência de todos.

Ao contrário de jogos com ciclos longos e progressão espaçada, aqui a urgência nunca diminui. The Alters sabe prender o jogador nessa tensão constante entre o que é necessário, o que é possível e o que pode custar a vida de todos.

A Base — Um Mecanismo Vivo em Constânte Transformação

A base móvel onde Jan e seus Alters vivem e trabalham é um dos pilares da experiência em The Alters. Longe de ser um mero cenário, ela funciona como um mecanismo complexo que exige atenção constante.

Precisamos gerenciar energia, temperatura, comida, medicamentos, e até o bem-estar emocional dos habitantes, incluindo o próprio protagonista. Cada ala da base pode ser construída, atualizada e personalizada com diferentes propósitos, onde dormitórios, oficinas, cozinhas, centros médicos e salas de recreação compõem esse microcosmo que espelha o estado interno do protagonista.

O gerenciamento não é raso ou apenas mecânico, ele é narrativo. Deixar faltar comida ou atrasar o reparo de um setor afeta diretamente os Alters envolvidos naquela função, o que desencadeia conflitos ou colapsos emocionais.

A interface da base reforça a ideia de um ciclo, onde tudo o que se extrai, transforma ou gasta tem um impacto. A energia, por exemplo, não é infinita e, com o tempo, é necessário fazer escolhas entre manter setores ligados ou desligar temporariamente espaços fundamentais.

Há um ritmo tenso e calculado nesse gerenciamento, mas não no sentido de apressar o jogador, The Alters quer que cada decisão tenha peso e cada falha seja sentida como parte da jornada.

O crafting de objetos, ferramentas e upgrades depende da coleta de materiais, que também exige preparação e alocação inteligente dos Alters certos para cada missão. É um jogo que exige visão estratégica e empatia acima de tudo.

No espelho do Legado

Não é preciso dizer que The Alters não é um jogo para todos, é uma experiência única que, talvez apenas jogadores que já tiveram contato com os títulos da 11 Bit Studios irão realmente apreciar essa obra.

Ao apostar em uma proposta tão existencial e introspectiva, ele desafia as fórmulas padronizadas do mercado e se posiciona como uma experiência que provoca, incomoda e, ao mesmo tempo, acolhe. É um convite à reflexão disfarçado de jogo de sobrevivência, e talvez resida aí sua maior genialidade.

Mesmo com sistemas que ainda podem ser refinados e escolhas de ritmo que exigem paciência, o projeto da 11 Bit Studios demonstra uma maturidade rara que sabe transmitir e como dese ser transmitido aos jogadores.

Não importa se você jogará com pressa, curiosidade ou envolvimento emocional, em algum momento, “The Alters” vai te encarar de volta, e o que você fizer diante desse olhar intenso será problema seu.


Para mais informações, siga nossas Redes Sociais ou visite o Site Oficial de The Alters!


Uma cópia de The Alters para PC (Steam) foi gentilmente concedida à nossa equipe pela Assessoria de Imprensa da 11 Bit Studio, permitindo a elaboração desta análise.
Visão Geral
  • 8.5Total Score

    The Alters é uma experiência singular que combina ficção científica e sobrevivência com uma narrativa introspectiva rara.

    Seu sistema de múltiplas versões de si mesmo amplia o drama pessoal e estratégico, mas alguns ajustes nas mecânicas e ritmo poderiam aprimorar a fluidez da jogabilidade. Ainda assim, é uma obra madura que desafia padrões e conquista pela profundidade.

0 0 votos
Article Rating
Inscrever-se
Notificar de
0 Comentários
mais antigos
mais recentes Mais votado
Feedbacks embutidos
Ver todos os comentários
Login
Loading...
Sign Up
Loading...
0
Adoraria saber sua opinião, comente.x